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Um terço das crianças de 0 a 3 anos mais pobres do Brasil está fora da creche por falta de vaga, diz IBGE

Existe uma correlação entre a renda das famílias e a oferta de vagas em creches no Brasil, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) divulgados nesta sexta-feira (18) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entre as crianças de 0 a 3 anos que pertencem aos 20% com a renda domiciliar per capita mais baixa do país, 33,9% estão fora da escola porque não existe vaga ou creche perto delas. Já entre no grupo de 20% com a renda mais alta, esse problema só atinge 6,9% das crianças.

De acordo com Marina Aguas, coordenadora da pesquisa, existe “uma associação muito forte” entre a renda e a escolaridade da população que começa inclusive na idade pré-escolar.

“É uma associação de mão dupla: você não sabe se a renda explica o acesso à escola, ou se o acesso à escola explica a renda”, explicou ela, em entrevista ao G1.

Marina diz que os dados oferecem detalhes sobre a demanda e a oferta do serviço e podem servir de base para o desenho de políticas públicas adequadas. Ela ressalta, ainda, a importância do acesso à educação na primeira infância. “Existe todo um debate enorme sobre o desenvolvimento cognitivo, da primeira infância, mostrando que o aprendizado nessa idade é muito importante para o futuro.”

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Crianças mais pobres têm menos acesso à creche
Cada faixa de renda representa 20% da população, em ordem crescente de renda domiciliar per capita
Porcentagem da população nessa faixa de renda, segundo a situação33,933,923,723,727,527,528,728,721,821,836,136,115,415,444,144,16,96,952,852,8Faixa 1 (SEM VAGA)Faixa 1 (NA CRECHE)Faixa 2 (SEM VAGA)Faixa 2 (NA CRECHE)Faixa 3 (SEM VAGA)Faixa 3 (NA CRECHE)Faixa 4 (SEM VAGA)Faixa 4 (NA CRECHE)Faixa 5 (SEM VAGA)Faixa 5 (NA CRECHE)0102030405060
Fonte: Pnad 2017 Educação/IBGE

Oferecer vaga em creche para todas as crianças não é obrigatório para o governo brasileiro e, segundo os dados, a maior parte dos pais com filhos de 0 a 3 anos afirmaram que seus filhos não estão matriculados por decisão da própria família – entre os bebês de 0 a 1 ano, dois terços dos pais dizem que preferem que eles não frequentem a escola nessa idade.

Porém, até 2024, segundo o Plano Nacional de Educação (PNE), o Brasil precisa garantir que 50% da população de 0 a 3 anos esteja matriculada em creches. Em 2017, segundo a Pnad, essa taxa aumentou 2,3 pontos percentuais, com cerca de 210 mil novas matrículas, e chegou a 32,7% considerando a média nacional. Porém, essa meta já foi batida, considerando apenas o grupo de 20% das crianças com a renda familiar per capita mais alta do país.

Essa previsão faz parte da meta 1 do PNE. O plano foi aprovado em 2014 e tem duração prevista de dez anos. Ele instituiu uma série de indicadores que o país precisa atingir dentro de períodos determinados.

Para especialistas, famílias mais pobres devem ser prioridade

Especialistas em educação ouvidos pelo G1 dizem que os resultados do Pnad mostram como as políticas públicas ainda não são eficazes para reduzir a desigualdade entre as classes brasileiras.

“A creche é hoje uma das etapas mais desiguais da educação, o que ajuda a demonstrar que a injustiça social começa desde os primeiros meses de vida”, afirma Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE).

“Há uma desigualdade gritante na matrícula, mas, mesmo para as crianças de famílias com menor renda matriculadas, há um problema grave da qualidade do equipamento. O Brasil tem permitido creches com profissionais despreparados, que mais se parecem depósitos de crianças. E isso preciso mudar.”

Priscila Cruz, diretora executiva do Todos Pela Educação, concorda.

“Toda pesquisa de acompanhamento do desenvolvimento mostra que é melhor se houver condições a criança ficar próxima da família, ainda mais se a creche tiver péssimas condições, que é o caso da maior parte do Brasil”, diz ela.

“Em geral as crianças ficam presas numa casinha olhando para o teto branco o tempo inteiro.” Priscila lembra que vários estudos já demonstraram que, se as crianças não forem estimuladas nesse período de vida, elas podem ter o seu desenvolvimento físico, cognitivo e emocional afetados e isso pode prejudicar o potencial de aprendizagem no futuro.

Os recursos do governo federal para auxiliar os municípios a cumprir a meta, porém, têm caído. Levantamento feito pelo G1 em dezembro mostrou que, entre 2015 e 2017, os repasses para o Brasil Carinhoso, programa para manter crianças pobres de 0 a 48 meses em creches, sofreram queda de 90%. Na época, o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) confirmou a redução, mas afirmou que o programa tem ajudado no aumento no aumento das vagas em creches (leia mais).

Daniel Cara destaca que, também nessa faixa etária há desigualdades de renda, étnico-raciais e regionais. “A pergunta é: como resolver? É preciso construir creches e pré-escolas para ampliar as matrículas, mas é preciso também mantê-las. O custo de manutenção de uma creche é equivalente ao de construção e quem tem recursos para isso é o governo federal, que tem a obrigação constitucional de apoiar os municípios, o que jamais fez a contento. Isso pode ser resolvido com o novo Fundeb”, diz ele, citando o debate sobre as alterações que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) deve passar neste ano no Congresso Nacional, quando pode se tornar permanente.

Priscila Cruz ressalta que os critérios socioeconômicos ajudam a explicar a desigualdade entre estudantes pobres e ricos, mas não pode servir como justificativa, e sim como embasamento para políticas públicas.

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