A força-tarefa do MPF (Ministério Público Federal) na Operação Lava Jato diz que os recibos de pagamento de aluguel do apartamento vizinho ao do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em São Bernardo do Campo (SP), são “ideologicamente falsos”.
Na tarde de quinta-feira (5), os procuradores apresentaram um “incidente de falsidade criminal” ao juiz federal Sergio Moro, responsável pelos processos da Lava Jato na primeira instância. O procedimento pede “a produção de novas provas que possam contribuir para evidenciar a falsidade”, diz o MPF por meio de nota. Moro ainda não se manifestou a respeito do incidente.
O pedido pela produção de provas, de acordo com o MPF, tem como objetivo esclarecer pontos específicos, “como se houve alguma adulteração também dos próprios papéis, por quem e quando estes recibos foram feitos e onde estavam”. A Lava Jato ressalta que os recibos “não foram encontrados em diligências de busca e apreensão anteriores”.
“Sem margem à dúvida que os recibos juntados pela defesa de Luiz Inácio Lula da Silva são ideologicamente falsos, visto que é simulada a relação locatícia representada pelo engendrado contrato de locação”, afirmou a Procuradoria da República.
A Procuradoria pede ainda que os recibos originais sejam apresentados. Os procuradores pediram a Moro que “seja determinada a realização de perícias grafoscópica e documentoscópica sobre os documentos, com vistas ao esclarecimento dos quesitos a serem oportunamente apresentados pelo Ministério Público Federal e pelos réus, após intimação para tanto”.
Procurada pela reportagem do UOL, a defesa de Lula manteve o posicionamento informado na quinta-feira (5). Em nota, o advogado do ex-presidente, Cristiano Zanin Martins, chamou os procuradores de “ilusionistas”. “O questionamento do MPF é uma tática ilusionista de quem não conseguiu provar que valores provenientes de contratos da Petrobras beneficiaram Lula”.
Segundo Zanin, a realização de perícia nos recibos “irá demonstrar que eles são idôneos e que foram assinados pelo proprietário do imóvel”.
A história dos recibos
Em 25 de setembro, a defesa do ex-presidente apresentou recibos que comprovariam o pagamento de aluguel referente ao período entre fevereiro de 2011 e novembro de 2015. O proprietário do imóvel, o engenheiro Glaucos da Costamarques, disse que assinou os recibos em uma única data no final de 2015 durante o período em que esteve internado no hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Ele também afirma que nunca havia recebido os pagamentos até então.
O engenheiro diz que os pagamentos começaram a ser feitos após a prisão de seu primo, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. Bumlai já foi condenado por Moro a mais de nove anos de prisão em um processo da Lava Jato por corrupção e gestão fraudulenta em instituição financeira.
O MPF quer esclarecer se os recibos foram realmente assinados por Costamarques e, se isso aconteceu, em que data ocorreu.
De acordo com o MPF, Costamarques seria um “laranja” da empreiteira Odebrecht usado para comprar o apartamento a título de vantagens indevidas para Lula. No mesmo processo, sobre um esquema de corrupção envolvendo oito contratos entre a Odebrecht e a Petrobras, também se analisa a compra de um terreno na capital paulista que serviria como sede para o Instituto Lula. O engenheiro também esteve envolvido nessa negociação.
“O MPF afirmou, já na denúncia [apresentada em dezembro de 2016], que há provas substanciais que demonstram a falsidade do contrato de locação referente ao imóvel atribuído ao ex-presidente”, diz a Lava Jato. “As provas também apontam que os recibos de supostos pagamentos da locação simulada, que foram apresentados pela defesa somente após mais de nove meses da tramitação da ação penal, são igualmente falsos”.
Segundo os procuradores, “não há fluxo financeiro que comprove a relação de locação”. “Ou seja, as provas demonstram que o contrato e o recibo são papéis criados para disfarçar a real titularidade do imóvel usado pelo ex-presidente, que foi comprovadamente comprado com recursos oriundos da Odebrecht”.
Os recibos só foram anexados ao processo quase dez meses após a denúncia, que citava questões em relação à locação do imóvel. A defesa de Lula diz que os encontrou junto a pertences da ex-primeira-dama Marisa Letícia, locatária do imóvel, que faleceu em fevereiro deste ano. (Com Estadão Conteúdo)